Foto: Dhavid Normando/AE
Embola aí o Flu e o Vasco nessa história, deixa os dois revezando e o nosso queridinho como único com lado único, sem nunca trocar, no Maraca, assim pensa o especialista flamenguista, que diz que é outro estádio, um new Maracanã agora, então pode mudar. Que tradição, que história, que direito conquistado em campo nada, besteira, bobagem, diz o cara, e por isso a decisão da Taça Guanabara de 2019 é histórica, como todas as outras, e é também revolucionária.
Em todo o elenco campeão da Taça Guanabara de
2019 não há um Ademir, nem Barbosa, nem Eli, nem Jorge, nem Augusto, nem Chico,
nem Ipojucã, nem Friaça, nem Wilson, nem Rafagnelli, nem Lelé, não há um Dimas,
nem Isaías e muito menos um Maneca, mas há um Danilo, e foi justamente ele,
Danilo Barcelos, xará do Príncipe, cérebro e mola-mestra do Expresso da
Vitória, maior time que o estado do Rio de Janeiro viu jogar em mais de cem
anos de futebol por essas plagas, foi Danilo Barcelos quem marcou o gol um
tanto espírita do título, no lado exato do Maracanã conquistado para a torcida
vascaína por Danilo Alvim, Barbosa, Eli, Ademir, Maneca, Chico e cia há sessenta e oito anos, em campo, dentro das quatro linhas.
Os deuses da Bola, de novo, graças aos deuses da
Bola mais essa pra nossa história, mais uma lição pro nosso freguês virgem de
títulos internacionais, nem Copa Conmebol nem Sulamericana, que não cansa de
despertar vergonha alheia, enquanto a mídia, diante dos óbvios vilões da
história, um presidente do Fluminense, a outra, desembargadora, a mídia
assoviou pro alto e partiu pra generalização, revoltada contra tudo, contra todos
os sujeitos ocultos ou indeterminados pra incluir o Vasco e a Federação no rol
dos culpados, quando ela própria poderia encerrar o assunto ainda na
origem, há seis anos, se questionasse o tal contrato hoje posto no mesmo nível
de uma conquista no gramado, histórica, e que só pode ser ilegal, inválido,
pois dispõe sobre um direito do Vasco na encolha, por baixo dos panos, sem que
o Vasco fosse sequer informado.
O Vasco tornou-se o primeiro clube campeão no
Maraca no dia 28 de janeiro de 1951, ao vencer o América por 2 a 1 na decisão
do Carioca de 50, dois gols de Ademir diante de um público pagante de 104.775
pessoas. Campeão invicto pela terceira vez em cinco anos, o Expresso da Vitória
foi Bi no novo estádio e sua torcida foi a primeira de todas, também, a fechar praticamente sozinha o
anel da arquibancada. Gigantesca, bicampeã, única campeã continental da época em todo o planeta, a torcida vascaína escolheu ficar sempre, a partir deste
dia em que fechou o anel, só ela, do lado do mandante, à direita das cabines de rádio, com o
time no banco de reservas bem atrás do bandeirinha.
O Botafogo também escolheu esse lado, hoje tido
como Sul, e só trocava quando jogava justamente contra o Vasco, enquanto o
outro lado, hoje Norte, ficou dividido entre o Flamengo e, vejam vocês, o
Fluminense. Em dia de Fla x Flu, assim como ocorria com Botafogo x Vasco, a
torcida menor mudava de lado. E assim correram os dias, meses, anos, décadas,
mais de seis décadas de respeito absoluto às leis do campo, da história regida
pelos deuses da Bola, até que veio a privatização, a demolição, reconstrução, a
roubalheira desenfreada pra descaracterizar o Maracanã e o aristocrático,
nobilíssimo Fluminense Futebol Clube viu neste triste momento de nossa história
a chance de se dar bem.
Presidido na época por um sujeito que atendia
pelo brasileiríssimo nome de Peter, o freguês das Laranjeiras correu pra ser o
primeiro a negociar com a diretoria de então do estádio, hoje investigada por
diversos tipos de falcatruas, todas abalizadas pelo governador que está preso,
que, aliás, é vascaíno. Sabe-se lá como, Peter, the president, conseguiu um
contrato com a diretoria suspeita do estádio altamente lesivo ao Maracanã e bom
para seu clube, com o estádio sempre vazio e o Fluminense, feliz, estendendo o
tapetinho com seu escudo no lado que escolheu pra ser dele e só dele, de mais
ninguém, por trinta e cinco anos, e então ficamos sabemos todos nós que,
durante sessenta e três anos ocupando o lado Norte do Maracanã, o Fluminense
queria mesmo era o Sul, o único conquistado no gramado do estádio em questão,
pelo Expresso da Vitória.
O Vasco então chiou, claro, mesmo na figura de um
presidente banana, posto lá pela Justiça e pela mídia, juntas, o Clube reclamou
e a imprensa esportiva especializada, toda ela, disse que era bobagem, besteira
querer brigar pelo direito conquistado em campo, pelo maior time de sua
história, não vale a pena, tem o contrato, disseram todos os especialistas, e
aí deu pra entender muito bem porque o Fluminense, detentor da mesma Taça
Olímpica conquistada pela Federação Norueguesa de Esqui, pela cidade de
Springfield, em Massachusetts, e pelo Touring Club tanto da Itália quanto da
França, não escolheu o lado que sempre tinha sido o dele, não. Imaginem o Flamengo tendo de mudar de lado porque
o Fluminense chegou e negociou antes com o Maracanã um contrato lesivo ao
estádio, suspeito. Imaginem os comentários e as fisionomias dos especialistas e
podem rir à vontade, podem gargalhar na cara de quem vislumbrar a possibilidade
de, nesse caso, eles também considerarem o assunto uma grande bobagem.
Desde o início da guerra descarada ao Vasco, logo
após a maior virada de todos os tempos, o Tetra Brasileiro e o SBT na camisa, a
mídia entrou numa de tentar mudar a realidade histórica, pra todo o sempre, do
futebol carioca, a de que entre os quatro grandes, dois são maiores, um por
conta própria, pela miscigenação de forças de todas as cores e classes sociais
capaz de erguer, sozinha, um estádio, o outro com muita, mas com muita ajuda de
todo mundo, inclusive e mais ainda, da própria mídia.
Depois de ter participação efetiva em três
rebaixamentos, ajudando a trocar diretoria, minimizando sequências de treze,
quinze erros escandalosos de arbitragem como se todos ocorressem com todo
mundo, normal, a mídia achou que podia rebaixar, ela própria, o Vasco. Nosso
queridinho está acima de todos e os outros três estão iguais, abaixo, decidiram
de repente todos os especialistas com base só no dinheiro, porque em títulos
para o Super Flamengo em todo o período dourado, muito pouco e precisando, como
sempre, da bola entrando trinta centímetros e não sendo gol, não, do gol em
impedimento clamoroso no último minuto, este sim validado, e do juiz comemorando
o gol com falta clara no zagueiro adversário.
O Vasco não é maior que Bota e Flu, e não pode
ser comparado ao mengão, não, esta é a teoria atual da grande mídia esportiva,
que, pra mantê-la, é capaz de transmitir uma vitória do Vasco no mesmo Estádio
Nacional de Santiago onde foi conquistado o Sulamericano de 48, primeiro
torneio continental de clubes da história do futebol, há exatos setenta anos do
maior dos nossos títulos, no ano passado, como quiseram os deuses da Bola,
amigos, e mesmo com todas essas coincidências, ganchos, não citar uma vez sequer esta conquista, e olha que, com a vitória vascaína sobre a La U,
gols de Bruno e Silva e Pikachu, o narrador ficou exaltando nossa grandeza,
enumerando conquistas, Brasileiros, Libertadores e em nenhuma vez, vá saber por
que, o Sulamericano.
O Vasco é o primeiro campeão continental da
história da Bola, é bicampeão sulamericano e essas verdades, na grande mídia
esportiva, ninguém fala, então é mole para os especialistas da matéria acharem
bobagem essa briga pelo lado da torcida no mais famoso estádio do país, quiçá
do planeta, é fácil equiparar um contrato ilegal, por dispor de algo sem poder
pra isso, com um direito legítimo conquistado no gramado do tal estádio,
dizendo que cada um tem a sua razão com a maior cara de pau. Embola aí o Flu e
o Vasco nessa história, deixa os dois revezando e o nosso queridinho como único
com lado único, sem nunca trocar, no Maraca, assim pensa o especialista flamenguista, que diz que é outro estádio, um new Maracanã agora, então pode
mudar. Que tradição, que história, que direito conquistado em campo nada,
besteira, bobagem, diz o cara, e por isso a decisão da Taça Guanabara de 2019 é histórica, como todas as outras, e é também revolucionária.
A torcida do Vasco teve um direito seu tirado com
base num contrato que deveria ser investigado, mas que foi levado a sério de
imediato por quem deveria questioná-lo, a mesma mídia que até hoje tenta nos
convencer de que esta briga é uma bobagem. Domingo era o dia de acabar de vez
com essa palhaçada e a torcida do Vasco comprou mais de 30 mil ingressos antes
e depois do pleito covarde à Justiça do Fluminense, mesquinho, que pediu
simplesmente os portões fechados à desembargadora Lúcia alguma coisa que,
inacreditavelmente, acatou a vontade tricolor, e quando o Vasco recorreu, tentando
mostrar o risco de tamanho disparate, a magistrada manteve, firme, sua decisão.
Teve ainda o presidente do Fluminense, um tal de
Abad, dando piti em entrevista coletiva, enganando a própria torcida que ele
convocou pra “guerra”, machão à beça, enquanto ia ao tapetão pra fechar o
portão, teve tudo isso e a Polícia Militar, os Bombeiros, o governo do estado,
a prefeitura, todas as autoridades concordavam que a pior solução para o
impasse, àquela altura, era o fechamento do portão. O presidente do Vasco, Alexandre Campello, fez o
certo, então, deu dedão pra decisão estapafúrdia da Justiça e disse que o clube
poderia, no caso, arcar com a multa estipulada pela desembargadora sem noção e
abrir a porra do portão, enquanto a torcida do Vasco simplesmente foi ao
estádio, pra ver a decisão. Só que o nosso Judiciário é tinhoso, decide o
absurdo e finca pé firme pra mantê-lo pra não perder a autoridade, mandão, e o
juiz de plantão no estádio decidiu não abrir o portão, não, e o jogo começou
com 30 mil vascaínos do lado de fora, de ingresso na mão, e aí a torcida
começou a ganhar a Taça Guanabara 2019 pro Vascão.
Enquanto narradores e comentaristas bradavam
contra tudo e contra todos pela vergonha da decisão sem torcida, começaram-se a
ouvir bombas do lado de fora do estádio, com a bola rolando. Era a nossa briosa
PM que fez o estardalhaço de sempre, mantendo o hábito de reprimir qualquer
ameaça de invasão com o exagero e a estupidez que são tão gratas, ao que
parece, à corporação. Mas quem disse que a torcida do Vasco ia embora? Não, e o
barulho continuou, e narradores e comentaristas antevendo tragédias, enquanto
faziam brincadeiras com o silêncio das arquibancadas, até que lá pelos 30
minutos do primeiro tempo veio a informação: os portões seriam abertos, sim,
então a mídia especializada se traiu, ela que parecia tão revoltada com a
situação.
No gramado, ao entrevistar Campello minutos antes
da partida, a repórter loura da televisão, que apresentava antes um daqueles
programas super bem humorados, descontraídos, já dava o tom perguntando, meio
que questionando, por que, diante dos portões fechados, convocar a torcida a ir
ao estádio. Como assim um presidente chamando a torcida do clube dele pra
apoiar o time na decisão, deve ter perguntado um editor discutindo rapidamente
a pauta, ou ela mesma, repórter, pode ter pensado isso, por que não? O fato é
que, quando veio a decisão, quando entrou o grande Cláudio no lado Sul da
arquibancada do Maraca, com a camisa branca e a faixa diagonal preta, a cruz de
malta no peito, jogando água na cabeça e gritando Vascooooo, teve especialista
questionando a decisão, e também à noite e no dia seguinte, depois da partida.
Mas que bagunça essa Justiça, primeiro fecha e depois abre os portões,
exclamaram vários deles, em várias emissoras de rádio e televisão.
Preferiam que o estádio continuasse vazio,
certamente, que se o Vasco fosse campeão, pelo menos que fosse sem torcida, que
o lado Sul do Maraca continuasse, com base num contrato suspeito, só com o
Fluzão, só que não. Depois do Cláudio e seu filho, mais um amigo ou parente, entraram
outros vinte e tantos mil, depois de esperarem pacientemente até o início do
jogo, depois de correrem dos tiros de borracha, do gás da polícia, depois de
tudo isso, jogando água na cabeça ou não, a torcida do Vasco retomou o território
pra sempre dela, segundo a vontade dos deuses da Bola, e no grito, na raça, na
força, fez o clube ganhar sua décima terceira Taça Guanabara, com o gol sem
querer de Danilo Barcelos na rede do nosso lado, conquistado por Danilo
Alvim e todo o Expresso da Vitória. Vasco campeão invicto com o ataque mais positivo, a defesa menos vazada, sete jogos, sete vitórias e sua torcida no lado Sul do Maraca, cem por
cento Vascão.
Pitacos em itálico
Uma manchete de alto de página, só uma, falando que o CT estava interditado, uma reportagem apenas na tevê ou na internet, de outubro de 2017 até o comecinho deste triste fevereiro, e talvez os meninos não estivessem mais alojados nos contêineres inflamáveis, com uma única saída e grades nas janelas, na hora do incêndio, mas a não ser em parênteses escondidos no meio do texto, a mídia não quer discutir isso de frente, até agora não parece querer conversar sobre o papel dela mesma, debater sobre até que ponto a benevolência histórica e reiterada da imprensa esportiva com o clube da Gávea, que consagrou o termo flapress, contribuiu, também, pra tamanha tragédia.
Pitacos em itálico
Uma manchete de alto de página, só uma, falando que o CT estava interditado, uma reportagem apenas na tevê ou na internet, de outubro de 2017 até o comecinho deste triste fevereiro, e talvez os meninos não estivessem mais alojados nos contêineres inflamáveis, com uma única saída e grades nas janelas, na hora do incêndio, mas a não ser em parênteses escondidos no meio do texto, a mídia não quer discutir isso de frente, até agora não parece querer conversar sobre o papel dela mesma, debater sobre até que ponto a benevolência histórica e reiterada da imprensa esportiva com o clube da Gávea, que consagrou o termo flapress, contribuiu, também, pra tamanha tragédia.
*Acabou, já era essa história, que esse contrato do freguês das
Laranjeiras seja questionado a cada entrevista nossa, que se vá à Justiça
contra esse absurdo, mas o Vasco não pode mais aceitar o lado Norte nem se o
Flu for mandante. Acabou, retomamos o Lado Sul ou já era, sem jogo nosso no
Maracanã e esse é o primeiro de meus pitacos em itálico ao fim de cada texto
que o leitor deve ter percebido, no último, e agora tem a certeza de que será
bimestral. Sim, a cada dois meses um texto sobre o momento do nosso Vasco, é o
que espero conseguir daqui pra frente, então deixa eu continuar com os pitacos,
em itálico, claro.
*Palmas para o afago ao maior rival na camisa contra o Resende, sim.
Preocupação com a bandeirinha do Flamengo entrelaçada com a do Vasco? Por
favor, nenhuma. Real e Atlético de Madrid usaram o escudinho um do outro em
duas finais de Champions. Em qualquer grande jogo decisivo, hoje em qualquer
continente, segue-se a norma criada na Europa de ter o escudo ou o nome do
adversário na camisa, com a data e o local da partida, então, na boa, tem de
ser um tantinho inseguro pra se preocupar com a bandeirinha do rival na camisa.
Em frente, juntos, e a mensagem da camisa também tá certa, sem força Flamengo,
sem deixar de saber que toda força deve ir única e exclusivamente pras famílias
das vítimas, mas sabendo também que o coirmão não queria matar seus meninos,
que o baque pra eles é enorme, eterno, e que por isso demandava, do Vasco, uma
posição.
Em frente, juntos, a mensagem solidária que não deixa de dar seu
recado, contundente, que tem tudo a ver com o respeito ao nosso lado Sul. Pela
história, pelos títulos internacionais (os nossos no campo, na bola, os deles
daquele jeito que todos conhecem), pelo tamanho de suas torcidas Vasco e
Flamengo estão juntos no Rio, um pouco acima de Botafogo e Fluminense. Querer
mudar isso com base no dinheiro, ou num contrato, isso é que é bobagem. A mídia
não falou nada disso sobre a camisa, claro, mas adorou o que chamou de
homenagem, elogiou, ficou até emocionada e elegeu, como quase sempre, um vilão
dessa bela história que, graças à deixa de dirigentes nossos, foi, vejam vocês a coincidência,
o Vasco.
*E não faltou nesse começo de ano o tradicional mau humor de dez entre dez especialistas com os
estaduais, com o carioca, principalmente, que dessa vez foi criticado também
pelo calor, insano, dos jogos às 17h do horário de verão, em janeiro, em Bangu,
Bacaxá e Madureira, a 40 graus à sombra e vieram depois, só depois, os
protestos do sindicato dos jogadores e descobriu-se que o horário tinha sido imposto pela
televisão, e que entre os quatro grandes, só o
Vasco jogou às cinco da tarde de janeiro, alto verão, em Bangu, e só o Vasco
jogou no mesmo horário, no mesmo mês, em Madureira, aliás, na estreia,
iniciando os cem por cento de aproveitamento nessa coincidência danada sempre
contra o Vascão.
*Outra coincidência, vejam vocês. Dos doze maiores clubes do Brasil,
cinco estão jogando a Copa do Brasil desde a fase inicial: Vasco, Botafogo,
Fluminense, Corinthians e Santos. Todos se classificaram pra segunda fase, na
qual o mando de campo do jogo único é definido por sorteio, e só um foi sorteado
pra jogar fora de casa, justamente o Vasco. Não é uma coincidência
impressionante? Ainda bem que Yan Sasse fez o dele, Máxi Lopes salvou, Lucas
Mineiro mostrou que é bom mesmo de cabeça e Ribamar desencantou. Com todo o
respeito ao digníssimo Juazeirense, da Bahia, ao brioso Serra do Espírito
Santo, passamos pelas duas fases iniciais e vamos como final de Copa, agora,
pegar Avaí ou Brasil de Pelotas, aqui e lá. Sigamos.
*Antes de terminar, toda honra e toda a glória aos meninos da Copinha.
Campanha maravilhosa, com atuação de gala, honrando a camisa, na final, depois
do tradicional roubo fundamental para o resultado da partida. Falta clara em
João Pedro na entrada da área do São Paulo, que o juiz não deu e o narrador,
claro, não viu, gol no contra-ataque e 1 a 0 pra eles quando poderia estar 1 a
0 pra nós, como mostrou Lucas Santos ao fazer o golaço que iniciou a reação até
o empate com Tiago Reis, outra grata revelação. Dane-se o resultado de uma Copa
com arbitragem paulista, as notícias são ótimas e ainda temos Marrony,
mostrando que a fábrica de onde saiu Dinamite, Romário, Sorato, Valdir, Jardel,
Allan Kardec e, por último, Paulinho, continua a todo vapor e, graças aos
deuses da Bola, produzindo.
*Por falar em base, não tem como não registrar aqui a tragédia do
Ninho do Urubu, nesse caso pra ressaltar a surpresa de só agora, depois do
ocorrido, ficarmos sabendo que o tal centro de treinamento mais moderno do
planeta, com nível de hotel quatro estrelas, inigualável entre seus pares, está
interditado pela Prefeitura desde outubro de 2017. Coisa de trinta multas já
foram dadas ao Flamengo pelas autoridades responsáveis e tudo o que se dizia na
mídia sobre o local interditado, antes das mortes de dez meninos, eram loas,
elogios à estrutura sensacional. E logo após o incêndio dos contêineres com uma
saída apenas para todos eles, e grades nas janelas, houve especialista
conseguindo ainda enaltecer o Flamengo dizendo que se no clube da Gávea, o mais
rico ou mais capacitado ou mais bem estruturado de todos, acontecia uma coisa
dessas, imagine o que não poderia acontecer nos outros e não, mil vezes não,
não me venham com essa, porque um acidente dessas proporções só poderia
acontecer num clube que tem seu centro de treinamento interditado e continua a
treinar lá e isso não causa nem uma materinha em jornal, nem um título de canto
de página, e a imprensa continua a enaltecer seu centro de treinamento sem
revelar que o lugar, na verdade, está interditado.
Uma manchete de alto de página, só uma, falando que o CT estava
interditado, uma reportagem apenas na tevê ou na internet, de outubro de 2017
até o comecinho deste triste fevereiro, e talvez os meninos não estivessem mais
alojados nos contêineres inflamáveis, com uma única saída e grades nas janelas,
na hora do incêndio, mas a não ser em parênteses escondidos no meio do texto, a
mídia não quer discutir isso de frente, até agora não parece querer conversar
sobre o papel dela mesma, debater sobre até que ponto a benevolência histórica e
reiterada da imprensa esportiva com o clube da Gávea, que consagrou o termo
flapress, contribuiu, também, pra tamanha tragédia.
*E claro que as autoridades foram nos outros clubes e entre os quatro
grandes, um, somente um teve o centro de treinamento de seus profissionais, que
não tem alojamento, interditado. E é muita coincidência mesmo, minha gente,
porque esse clube, de novo, foi o Vasco. Falta um alvará de uma obra qualquer e
então tem de interditar, vaticinou a Prefeitura, e no dia seguinte à decisão
estava lá no jornal, com destaque, em manchete de alto de página: Justiça
interdita CT do Vasco. O Vasco está treinando em São Januário, enquanto o
Flamengo continua se preparando no lugar onde dez meninos morreram carbonizados,
no centro de treinamentos ultra-mega-hipermoderno, estruturado e, há mais de um
ano, interditado. Tudo certo, dentro do esperado, tudo cem por cento Vasco.