sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Cem por cento Vascão


Foto: Dhavid Normando/AE

Embola aí o Flu e o Vasco nessa história, deixa os dois revezando e o nosso queridinho como único com lado único, sem nunca trocar, no Maraca, assim pensa o especialista flamenguista, que diz que é outro estádio, um new Maracanã agora, então pode mudar. Que tradição, que história, que direito conquistado em campo nada, besteira, bobagem, diz o cara, e por isso a decisão da Taça Guanabara de 2019 é histórica, como todas as outras, e é também revolucionária.

Em todo o elenco campeão da Taça Guanabara de 2019 não há um Ademir, nem Barbosa, nem Eli, nem Jorge, nem Augusto, nem Chico, nem Ipojucã, nem Friaça, nem Wilson, nem Rafagnelli, nem Lelé, não há um Dimas, nem Isaías e muito menos um Maneca, mas há um Danilo, e foi justamente ele, Danilo Barcelos, xará do Príncipe, cérebro e mola-mestra do Expresso da Vitória, maior time que o estado do Rio de Janeiro viu jogar em mais de cem anos de futebol por essas plagas, foi Danilo Barcelos quem marcou o gol um tanto espírita do título, no lado exato do Maracanã conquistado para a torcida vascaína por Danilo Alvim, Barbosa, Eli, Ademir, Maneca, Chico e cia há sessenta e oito anos, em campo, dentro das quatro linhas. 

Os deuses da Bola, de novo, graças aos deuses da Bola mais essa pra nossa história, mais uma lição pro nosso freguês virgem de títulos internacionais, nem Copa Conmebol nem Sulamericana, que não cansa de despertar vergonha alheia, enquanto a mídia, diante dos óbvios vilões da história, um presidente do Fluminense, a outra, desembargadora, a mídia assoviou pro alto e partiu pra generalização, revoltada contra tudo, contra todos os sujeitos ocultos ou indeterminados pra incluir o Vasco e a Federação no rol dos culpados, quando ela própria poderia encerrar o assunto ainda na origem, há seis anos, se questionasse o tal contrato hoje posto no mesmo nível de uma conquista no gramado, histórica, e que só pode ser ilegal, inválido, pois dispõe sobre um direito do Vasco na encolha, por baixo dos panos, sem que o Vasco fosse sequer informado.

O Vasco tornou-se o primeiro clube campeão no Maraca no dia 28 de janeiro de 1951, ao vencer o América por 2 a 1 na decisão do Carioca de 50, dois gols de Ademir diante de um público pagante de 104.775 pessoas. Campeão invicto pela terceira vez em cinco anos, o Expresso da Vitória foi Bi no novo estádio e sua torcida foi a primeira de todas, também, a fechar praticamente sozinha o anel da arquibancada. Gigantesca, bicampeã, única campeã continental da época em todo o planeta, a torcida vascaína escolheu ficar sempre, a partir deste dia em que fechou o anel, só ela, do lado do mandante, à direita das cabines de rádio, com o time no banco de reservas bem atrás do bandeirinha.

O Botafogo também escolheu esse lado, hoje tido como Sul, e só trocava quando jogava justamente contra o Vasco, enquanto o outro lado, hoje Norte, ficou dividido entre o Flamengo e, vejam vocês, o Fluminense. Em dia de Fla x Flu, assim como ocorria com Botafogo x Vasco, a torcida menor mudava de lado. E assim correram os dias, meses, anos, décadas, mais de seis décadas de respeito absoluto às leis do campo, da história regida pelos deuses da Bola, até que veio a privatização, a demolição, reconstrução, a roubalheira desenfreada pra descaracterizar o Maracanã e o aristocrático, nobilíssimo Fluminense Futebol Clube viu neste triste momento de nossa história a chance de se dar bem.

Presidido na época por um sujeito que atendia pelo brasileiríssimo nome de Peter, o freguês das Laranjeiras correu pra ser o primeiro a negociar com a diretoria de então do estádio, hoje investigada por diversos tipos de falcatruas, todas abalizadas pelo governador que está preso, que, aliás, é vascaíno. Sabe-se lá como, Peter, the president, conseguiu um contrato com a diretoria suspeita do estádio altamente lesivo ao Maracanã e bom para seu clube, com o estádio sempre vazio e o Fluminense, feliz, estendendo o tapetinho com seu escudo no lado que escolheu pra ser dele e só dele, de mais ninguém, por trinta e cinco anos, e então ficamos sabemos todos nós que, durante sessenta e três anos ocupando o lado Norte do Maracanã, o Fluminense queria mesmo era o Sul, o único conquistado no gramado do estádio em questão, pelo Expresso da Vitória.

O Vasco então chiou, claro, mesmo na figura de um presidente banana, posto lá pela Justiça e pela mídia, juntas, o Clube reclamou e a imprensa esportiva especializada, toda ela, disse que era bobagem, besteira querer brigar pelo direito conquistado em campo, pelo maior time de sua história, não vale a pena, tem o contrato, disseram todos os especialistas, e aí deu pra entender muito bem porque o Fluminense, detentor da mesma Taça Olímpica conquistada pela Federação Norueguesa de Esqui, pela cidade de Springfield, em Massachusetts, e pelo Touring Club tanto da Itália quanto da França, não escolheu o lado que sempre tinha sido o dele, não. Imaginem o Flamengo tendo de mudar de lado porque o Fluminense chegou e negociou antes com o Maracanã um contrato lesivo ao estádio, suspeito. Imaginem os comentários e as fisionomias dos especialistas e podem rir à vontade, podem gargalhar na cara de quem vislumbrar a possibilidade de, nesse caso, eles também considerarem o assunto uma grande bobagem.

Desde o início da guerra descarada ao Vasco, logo após a maior virada de todos os tempos, o Tetra Brasileiro e o SBT na camisa, a mídia entrou numa de tentar mudar a realidade histórica, pra todo o sempre, do futebol carioca, a de que entre os quatro grandes, dois são maiores, um por conta própria, pela miscigenação de forças de todas as cores e classes sociais capaz de erguer, sozinha, um estádio, o outro com muita, mas com muita ajuda de todo mundo, inclusive e mais ainda, da própria mídia.

Depois de ter participação efetiva em três rebaixamentos, ajudando a trocar diretoria, minimizando sequências de treze, quinze erros escandalosos de arbitragem como se todos ocorressem com todo mundo, normal, a mídia achou que podia rebaixar, ela própria, o Vasco. Nosso queridinho está acima de todos e os outros três estão iguais, abaixo, decidiram de repente todos os especialistas com base só no dinheiro, porque em títulos para o Super Flamengo em todo o período dourado, muito pouco e precisando, como sempre, da bola entrando trinta centímetros e não sendo gol, não, do gol em impedimento clamoroso no último minuto, este sim validado, e do juiz comemorando o gol com falta clara no zagueiro adversário.

O Vasco não é maior que Bota e Flu, e não pode ser comparado ao mengão, não, esta é a teoria atual da grande mídia esportiva, que, pra mantê-la, é capaz de transmitir uma vitória do Vasco no mesmo Estádio Nacional de Santiago onde foi conquistado o Sulamericano de 48, primeiro torneio continental de clubes da história do futebol, há exatos setenta anos do maior dos nossos títulos, no ano passado, como quiseram os deuses da Bola, amigos, e mesmo com todas essas coincidências, ganchos, não citar uma vez sequer esta conquista, e olha que, com a vitória vascaína sobre a La U, gols de Bruno e Silva e Pikachu, o narrador ficou exaltando nossa grandeza, enumerando conquistas, Brasileiros, Libertadores e em nenhuma vez, vá saber por que, o Sulamericano.

O Vasco é o primeiro campeão continental da história da Bola, é bicampeão sulamericano e essas verdades, na grande mídia esportiva, ninguém fala, então é mole para os especialistas da matéria acharem bobagem essa briga pelo lado da torcida no mais famoso estádio do país, quiçá do planeta, é fácil equiparar um contrato ilegal, por dispor de algo sem poder pra isso, com um direito legítimo conquistado no gramado do tal estádio, dizendo que cada um tem a sua razão com a maior cara de pau. Embola aí o Flu e o Vasco nessa história, deixa os dois revezando e o nosso queridinho como único com lado único, sem nunca trocar, no Maraca, assim pensa o especialista flamenguista, que diz que é outro estádio, um new Maracanã agora, então pode mudar. Que tradição, que história, que direito conquistado em campo nada, besteira, bobagem, diz o cara, e por isso a decisão da Taça Guanabara de 2019 é histórica, como todas as outras, e é também revolucionária.

A torcida do Vasco teve um direito seu tirado com base num contrato que deveria ser investigado, mas que foi levado a sério de imediato por quem deveria questioná-lo, a mesma mídia que até hoje tenta nos convencer de que esta briga é uma bobagem. Domingo era o dia de acabar de vez com essa palhaçada e a torcida do Vasco comprou mais de 30 mil ingressos antes e depois do pleito covarde à Justiça do Fluminense, mesquinho, que pediu simplesmente os portões fechados à desembargadora Lúcia alguma coisa que, inacreditavelmente, acatou a vontade tricolor, e quando o Vasco recorreu, tentando mostrar o risco de tamanho disparate, a magistrada manteve, firme, sua decisão.

Teve ainda o presidente do Fluminense, um tal de Abad, dando piti em entrevista coletiva, enganando a própria torcida que ele convocou pra “guerra”, machão à beça, enquanto ia ao tapetão pra fechar o portão, teve tudo isso e a Polícia Militar, os Bombeiros, o governo do estado, a prefeitura, todas as autoridades concordavam que a pior solução para o impasse, àquela altura, era o fechamento do portão. O presidente do Vasco, Alexandre Campello, fez o certo, então, deu dedão pra decisão estapafúrdia da Justiça e disse que o clube poderia, no caso, arcar com a multa estipulada pela desembargadora sem noção e abrir a porra do portão, enquanto a torcida do Vasco simplesmente foi ao estádio, pra ver a decisão. Só que o nosso Judiciário é tinhoso, decide o absurdo e finca pé firme pra mantê-lo pra não perder a autoridade, mandão, e o juiz de plantão no estádio decidiu não abrir o portão, não, e o jogo começou com 30 mil vascaínos do lado de fora, de ingresso na mão, e aí a torcida começou a ganhar a Taça Guanabara 2019 pro Vascão.

Enquanto narradores e comentaristas bradavam contra tudo e contra todos pela vergonha da decisão sem torcida, começaram-se a ouvir bombas do lado de fora do estádio, com a bola rolando. Era a nossa briosa PM que fez o estardalhaço de sempre, mantendo o hábito de reprimir qualquer ameaça de invasão com o exagero e a estupidez que são tão gratas, ao que parece, à corporação. Mas quem disse que a torcida do Vasco ia embora? Não, e o barulho continuou, e narradores e comentaristas antevendo tragédias, enquanto faziam brincadeiras com o silêncio das arquibancadas, até que lá pelos 30 minutos do primeiro tempo veio a informação: os portões seriam abertos, sim, então a mídia especializada se traiu, ela que parecia tão revoltada com a situação.

No gramado, ao entrevistar Campello minutos antes da partida, a repórter loura da televisão, que apresentava antes um daqueles programas super bem humorados, descontraídos, já dava o tom perguntando, meio que questionando, por que, diante dos portões fechados, convocar a torcida a ir ao estádio. Como assim um presidente chamando a torcida do clube dele pra apoiar o time na decisão, deve ter perguntado um editor discutindo rapidamente a pauta, ou ela mesma, repórter, pode ter pensado isso, por que não? O fato é que, quando veio a decisão, quando entrou o grande Cláudio no lado Sul da arquibancada do Maraca, com a camisa branca e a faixa diagonal preta, a cruz de malta no peito, jogando água na cabeça e gritando Vascooooo, teve especialista questionando a decisão, e também à noite e no dia seguinte, depois da partida. Mas que bagunça essa Justiça, primeiro fecha e depois abre os portões, exclamaram vários deles, em várias emissoras de rádio e televisão.

Preferiam que o estádio continuasse vazio, certamente, que se o Vasco fosse campeão, pelo menos que fosse sem torcida, que o lado Sul do Maraca continuasse, com base num contrato suspeito, só com o Fluzão, só que não. Depois do Cláudio e seu filho, mais um amigo ou parente, entraram outros vinte e tantos mil, depois de esperarem pacientemente até o início do jogo, depois de correrem dos tiros de borracha, do gás da polícia, depois de tudo isso, jogando água na cabeça ou não, a torcida do Vasco retomou o território pra sempre dela, segundo a vontade dos deuses da Bola, e no grito, na raça, na força, fez o clube ganhar sua décima terceira Taça Guanabara, com o gol sem querer de Danilo Barcelos na rede do nosso lado, conquistado por Danilo Alvim e todo o Expresso da Vitória. Vasco campeão invicto com o ataque mais positivo, a defesa menos vazada, sete jogos, sete vitórias e sua torcida no lado Sul do Maraca, cem por cento Vascão.

Pitacos em itálico

Uma manchete de alto de página, só uma, falando que o CT estava interditado, uma reportagem apenas na tevê ou na internet, de outubro de 2017 até o comecinho deste triste fevereiro, e talvez os meninos não estivessem mais alojados nos contêineres inflamáveis, com uma única saída e grades nas janelas, na hora do incêndio, mas a não ser em parênteses escondidos no meio do texto, a mídia não quer discutir isso de frente, até agora não parece querer conversar sobre o papel dela mesma, debater sobre até que ponto a benevolência histórica e reiterada da imprensa esportiva com o clube da Gávea, que consagrou o termo flapress, contribuiu, também, pra tamanha tragédia.

*Acabou, já era essa história, que esse contrato do freguês das Laranjeiras seja questionado a cada entrevista nossa, que se vá à Justiça contra esse absurdo, mas o Vasco não pode mais aceitar o lado Norte nem se o Flu for mandante. Acabou, retomamos o Lado Sul ou já era, sem jogo nosso no Maracanã e esse é o primeiro de meus pitacos em itálico ao fim de cada texto que o leitor deve ter percebido, no último, e agora tem a certeza de que será bimestral. Sim, a cada dois meses um texto sobre o momento do nosso Vasco, é o que espero conseguir daqui pra frente, então deixa eu continuar com os pitacos, em itálico, claro.

*Palmas para o afago ao maior rival na camisa contra o Resende, sim. Preocupação com a bandeirinha do Flamengo entrelaçada com a do Vasco? Por favor, nenhuma. Real e Atlético de Madrid usaram o escudinho um do outro em duas finais de Champions. Em qualquer grande jogo decisivo, hoje em qualquer continente, segue-se a norma criada na Europa de ter o escudo ou o nome do adversário na camisa, com a data e o local da partida, então, na boa, tem de ser um tantinho inseguro pra se preocupar com a bandeirinha do rival na camisa. Em frente, juntos, e a mensagem da camisa também tá certa, sem força Flamengo, sem deixar de saber que toda força deve ir única e exclusivamente pras famílias das vítimas, mas sabendo também que o coirmão não queria matar seus meninos, que o baque pra eles é enorme, eterno, e que por isso demandava, do Vasco, uma posição.
Em frente, juntos, a mensagem solidária que não deixa de dar seu recado, contundente, que tem tudo a ver com o respeito ao nosso lado Sul. Pela história, pelos títulos internacionais (os nossos no campo, na bola, os deles daquele jeito que todos conhecem), pelo tamanho de suas torcidas Vasco e Flamengo estão juntos no Rio, um pouco acima de Botafogo e Fluminense. Querer mudar isso com base no dinheiro, ou num contrato, isso é que é bobagem. A mídia não falou nada disso sobre a camisa, claro, mas adorou o que chamou de homenagem, elogiou, ficou até emocionada e elegeu, como quase sempre, um vilão dessa bela história que, graças à deixa de dirigentes nossos, foi, vejam vocês a coincidência, o Vasco.

*E não faltou nesse começo de ano o tradicional mau humor de dez entre dez especialistas com os estaduais, com o carioca, principalmente, que dessa vez foi criticado também pelo calor, insano, dos jogos às 17h do horário de verão, em janeiro, em Bangu, Bacaxá e Madureira, a 40 graus à sombra e vieram depois, só depois, os protestos do sindicato dos jogadores e descobriu-se que o horário tinha sido imposto pela televisão, e que entre os quatro grandes, só o Vasco jogou às cinco da tarde de janeiro, alto verão, em Bangu, e só o Vasco jogou no mesmo horário, no mesmo mês, em Madureira, aliás, na estreia, iniciando os cem por cento de aproveitamento nessa coincidência danada sempre contra o Vascão.

*Outra coincidência, vejam vocês. Dos doze maiores clubes do Brasil, cinco estão jogando a Copa do Brasil desde a fase inicial: Vasco, Botafogo, Fluminense, Corinthians e Santos. Todos se classificaram pra segunda fase, na qual o mando de campo do jogo único é definido por sorteio, e só um foi sorteado pra jogar fora de casa, justamente o Vasco. Não é uma coincidência impressionante? Ainda bem que Yan Sasse fez o dele, Máxi Lopes salvou, Lucas Mineiro mostrou que é bom mesmo de cabeça e Ribamar desencantou. Com todo o respeito ao digníssimo Juazeirense, da Bahia, ao brioso Serra do Espírito Santo, passamos pelas duas fases iniciais e vamos como final de Copa, agora, pegar Avaí ou Brasil de Pelotas, aqui e lá. Sigamos.

*Antes de terminar, toda honra e toda a glória aos meninos da Copinha. Campanha maravilhosa, com atuação de gala, honrando a camisa, na final, depois do tradicional roubo fundamental para o resultado da partida. Falta clara em João Pedro na entrada da área do São Paulo, que o juiz não deu e o narrador, claro, não viu, gol no contra-ataque e 1 a 0 pra eles quando poderia estar 1 a 0 pra nós, como mostrou Lucas Santos ao fazer o golaço que iniciou a reação até o empate com Tiago Reis, outra grata revelação. Dane-se o resultado de uma Copa com arbitragem paulista, as notícias são ótimas e ainda temos Marrony, mostrando que a fábrica de onde saiu Dinamite, Romário, Sorato, Valdir, Jardel, Allan Kardec e, por último, Paulinho, continua a todo vapor e, graças aos deuses da Bola, produzindo.

*Por falar em base, não tem como não registrar aqui a tragédia do Ninho do Urubu, nesse caso pra ressaltar a surpresa de só agora, depois do ocorrido, ficarmos sabendo que o tal centro de treinamento mais moderno do planeta, com nível de hotel quatro estrelas, inigualável entre seus pares, está interditado pela Prefeitura desde outubro de 2017. Coisa de trinta multas já foram dadas ao Flamengo pelas autoridades responsáveis e tudo o que se dizia na mídia sobre o local interditado, antes das mortes de dez meninos, eram loas, elogios à estrutura sensacional. E logo após o incêndio dos contêineres com uma saída apenas para todos eles, e grades nas janelas, houve especialista conseguindo ainda enaltecer o Flamengo dizendo que se no clube da Gávea, o mais rico ou mais capacitado ou mais bem estruturado de todos, acontecia uma coisa dessas, imagine o que não poderia acontecer nos outros e não, mil vezes não, não me venham com essa, porque um acidente dessas proporções só poderia acontecer num clube que tem seu centro de treinamento interditado e continua a treinar lá e isso não causa nem uma materinha em jornal, nem um título de canto de página, e a imprensa continua a enaltecer seu centro de treinamento sem revelar que o lugar, na verdade, está interditado.
Uma manchete de alto de página, só uma, falando que o CT estava interditado, uma reportagem apenas na tevê ou na internet, de outubro de 2017 até o comecinho deste triste fevereiro, e talvez os meninos não estivessem mais alojados nos contêineres inflamáveis, com uma única saída e grades nas janelas, na hora do incêndio, mas a não ser em parênteses escondidos no meio do texto, a mídia não quer discutir isso de frente, até agora não parece querer conversar sobre o papel dela mesma, debater sobre até que ponto a benevolência histórica e reiterada da imprensa esportiva com o clube da Gávea, que consagrou o termo flapress, contribuiu, também, pra tamanha tragédia.

*E claro que as autoridades foram nos outros clubes e entre os quatro grandes, um, somente um teve o centro de treinamento de seus profissionais, que não tem alojamento, interditado. E é muita coincidência mesmo, minha gente, porque esse clube, de novo, foi o Vasco. Falta um alvará de uma obra qualquer e então tem de interditar, vaticinou a Prefeitura, e no dia seguinte à decisão estava lá no jornal, com destaque, em manchete de alto de página: Justiça interdita CT do Vasco. O Vasco está treinando em São Januário, enquanto o Flamengo continua se preparando no lugar onde dez meninos morreram carbonizados, no centro de treinamentos ultra-mega-hipermoderno, estruturado e, há mais de um ano, interditado. Tudo certo, dentro do esperado, tudo cem por cento Vasco.

O Vasco, a imprensa e um blog no meio

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