Pedir a destituição da diretoria do clube pela morte de um menino da base durante um treino, sem um médico próximo, muito menos equipamento ou ambulância para socorrer o garoto em convulsões no gramado, no entanto, ninguém, nem promotor, nem procurador, nem a imprensa, ninguém pediu.
Corria o ano de 2006,
o Rio se preparava para sediar os Jogos Panamericanos das obras superfaturadas e um promotor do
Ministério Público do estado (MPRJ) resolveu pedir a destituição de toda a
diretoria de um dos quatro grandes clubes da cidade, no caso, o Vasco da Gama.
O motivo? Desvios de valores referentes à participação em vendas de jogadores
da base no exterior, para contas em paraísos fiscais em nome não do Vasco, mas
de um amigo do presidente? Não. Deterioração a olhos vistos do clube, com a
sede em ruínas, sem água, com fezes vá saber de que animal no meio da quadra do
ginásio abandonado? Também não. A morte de um menino na base terceirizada, expulsa
de São Januário por ter seus alojamentos arruinados? Não, nada disso.
Muito bem remunerado
graças ao meu, ao teu, ao nosso suado dinheirinho pingado religiosamente, o
promotor do MPRJ pedia a destituição do presidente do Vasco e de toda a
diretoria do clube por conta de uma questão relacionada à venda de ingressos
para a semifinal da Copa do Brasil de 2006, na qual a equipe vascaína despachou
o velho e bom freguês das Laranjeiras. Foram tantos pontos de venda e era pra ter
sido outros tantos a mais, dizia o promotor, pra justificar a primeira tentativa
de intervenção da Justiça na soberania apaixonada de um clube de futebol.
Soberania essa que, pra maioria dos sócios, tem ainda o custo nada desprezível
das mensalidades, tudo para, também, ter o direito de votar pra presidente de
seu clube do coração.
Era o primeiro ano
de mandato do então governador Sérgio Cabral e da imprensa, em geral, ele
recebia o mesmo apoio maciço, empolgado, que recebeu até o fim de seu governo,
reeleito quase que por aclamação. E na editoria de esporte, no ano do Pan, com
todas as obras superfaturadas prontas ou quase, a imprensa não questionou em
uma linha sequer o motivo do pedido de intervenção no Vasco. Já tinha
inaugurado contra o clube havia seis anos, pelo menos, muito antes do que
contra qualquer líder ou partido político, a era das denúncias mastigadas,
quando a palavra das autoridades selecionadas, de acordo com a narrativa
escolhida, vira a verdade absoluta, sem um ai de dúvida, irrefutável, é a lei.
A Justiça na época
chegou a acatar o pedido do promotor, mas no fim das contas não destituiu a diretoria de um clube de massa,
eleita pelos sócios desse clube, por conta da quantidade de pontos de venda de
ingresso para um jogo de futebol. Cerca de um ano depois, porém, o Vasco
mostrou mais uma vez seu DNA pioneiro ao ser vítima do primeiro golpe
jurídico-midiático do continente, quatro anos antes de Eduardo Lugo no
Paraguai.
Sem julgamento de
mérito, com a mídia especializada chegando a tratar uma perícia judicial paga
pela oposição como sentença da Justiça e isso mais de uma vez, tanto em
matérias assinadas quanto nos textos rápidos, quase não notados, da cobertura
corriqueira, com o auxílio inestimável do então governador, à época nem perto
de ser incomodado com, imaginem, denúncias de corrupção, com a ajuda também do
Judiciário do estado, com tudo isso o presidente do Vasco foi, enfim,
destronado.
Entrou a nova
diretoria e com menos de seis meses o time que ficou a um travessão da
Libertadores em 2006, que chegou a liderar o Brasileiro de 2007 sem chegar nem
perto da zona de rebaixamento e que em 2008 já havia vencido o futuro
vice-campeão, Grêmio, e ainda faria 6 a 1 no Atlético Mineiro e 4 a 0 no Sport,
esse time com Leandro Amaral e Edmundo no ataque, mais Alex Teixeira, caiu da
nona colocação para o primeiro rebaixamento da história do Vasco, com o
discurso pronto, difundido pela mídia especializada, de que a culpa tinha sido
do ex-presidente.
Seguiram-se então mais
de seis anos de administração da diretoria que a Justiça colocou à frente do
Vasco, e neste período surgiu a denúncia, com a exibição de extratos bancários
e cópias de transferências entre contas, de desvios de valores referentes à
participação em vendas de jogadores da base no exterior, para contas em
paraísos fiscais em nome não do Vasco, mas de um amigo do então presidente, o
ex-ídolo Roberto Dinamite.
Infelizmente, no
entanto, o dileto promotor que tanto se preocupara com as questões relativas ao
Vasco em 2007, ao que parece não estava mais interessado nos dilemas vascaínos.
Não se preocupou com a queda para a segunda divisão e nada fez, não moveu uma
palha pra investigar tão grave denúncia, de corrupção explícita, referente a
participações nas negociações, no exterior, de atletas revelados pelo Vasco.
Já a morte de um
menino de 14 anos na base terceirizada do Vasco, ocorrida em 2012, foi motivo
de ação da Promotoria da Infância e da Juventude e da Procuradoria do Trabalho
do estado, que na época interditaram, por falta de condições, os alojamentos em
São Januário onde moravam 60 meninos. Pedir a destituição da diretoria do clube
pela morte de um menino da base durante um treino, sem um médico próximo, muito
menos equipamento ou ambulância para socorrer o garoto em convulsões no gramado,
no entanto, ninguém, nem promotor, nem procurador, nem a imprensa, ninguém
pediu.
Não houve voz no
Judiciário pra pedir a saída da diretoria do Vasco cujo único mérito, em seis
anos alongados de mandato, foi formar o time campeão da Copa do Brasil de 2011,
ainda que para isso tenha valido, na modesta opinião de quem escreve, muito
mais o acaso, a vontade dos deuses da bola, graças aos céus mais vascaínos do
que qualquer outro time, haja vista a história.
E se montou aquele
timaço no desespero do fracasso retumbante do projeto traçado para o ano, com o
pior início de Estadual dos 88 anos nos quais o time disputava o campeonato, a
diretoria da época, em compensação, conseguiu perder no apito escandaloso jogo
a jogo, calada, um Brasileiro com Fernando Prass, Allan, Fágner, Dedé, Rômulo,
Felipe, Juninho Pernambucano, Diego Souza, Éder Luis e todo o resto jogando bem
todos juntos, entrosados, muito por conta do Ricardo Gomes e, mais ainda, do
Cristóvão.
No ano seguinte o
Vasco saiu da Libertadores nas quartas-de-final, perdendo no último minuto para
o futuro campeão, na base também do tira-teima encurvado e nada de reclamação,
nem um pio dos dirigentes da época, mais preocupados, ao que parece, em reaver
investimentos pessoais feitos no clube. No Brasileiro de 2012 o time venceu nas
quatro primeiras rodadas, empatou com o Palmeiras fora de casa na quinta e, sem
a concorrência do rival do ano anterior, interessado só na Libertadores e no
Mundial, seria o candidato natural ao título não fosse o desmanche pontual, às
pressas, saindo Fagner e Diego Souza pra falar apenas das saídas plenamente
evitáveis se a prioridade fosse ganhar um Brasileiro, e não recompensar os
bolsos privados de cartolas e empresários.
A segunda queda para
a Série B foi o nocaute da administração Dinamite e o que se viu durante a
temporada de 2014 foi bem diferente da festa de 2009, quando até erro de
arbitragem teve a favor do Vasco, mas não na semifinal da Copa do Brasil contra
o Corinthians, claro, não naquele jogo decisivo em que o Vasco foi, de novo,
prejudicado, no pênalti de Chicão em Elton ignorado pelo juiz pertinho do
lance, no caso Leonardo Gaciba, outro futuro comentarista da tevê.
Em 2014 o Vasco não
liderou a Série B em uma só rodada, perdeu de 5 a 0 para o Avaí em São Januário
e subiu em terceiro lugar, garantindo o acesso com um tenso empate na penúltima
rodada, na maior partida da história do respeitável Icasa (CE), num Maracanã
lotado. O time subiu pendurando a camisa na trave, graças também ao Martin
Silva, ao Guiñazu, ao Douglas, ao Kléber Gladiador, ao Marlon... Sim, graças muito
mais ao lateral-esquerdo Marlon do que a qualquer integrante da diretoria.
Marlon foi o autor
de dois gols na primeira vitória da campanha, num São Januário vazio, e de um
cruzamento perfeito pra Thalles na vitória sobre o futuro campeão, já com a
torcida vascaína presente, aproveitando um desses raros períodos em que as autoridades
não tiram dela (e só dela) o direito de assistir a um jogo do clube do coração,
no estádio que esse clube construiu com zero centavo de dinheiro público, mantido
em condições, com todos os custos e dificuldades inerentes, há exatos 90 anos,
e que sobreviveu, até, à avalanche final da diretoria alçada ao comando do
Vasco pelo Judiciário estadual, com o apoio maciço, empolgado, da mídia.
Marlon, como todo o
resto do elenco, jogou a Série B com os salários atrasados, no time abandonado
pela diretoria em ritmo de fim de festa, incapaz, por exemplo, de reerguer um pedaço
do muro do complexo esportivo de São Januário, derrubado por um caminhão tão desgovernado
quanto o clube deteriorado a olhos vistos, com a sede em ruínas, sem água, com
fezes vá saber de que animal no meio da quadra do ginásio abandonado e o parque
aquático fechado, com a água da piscina olímpica, também a dos saltos
ornamentais escura, esverdeada, isso e mais o desvio de verbas escancarado, a
morte de um menino da base e nada de o Ministério Público pedir a interdição da
diretoria, nada de intervenção do Judiciário, não, muito pelo contrário.
Na base do
juridiquês incompreensível das liminares, no ritmo adequado do abrir e fechar de
gavetas com processos, a Justiça concedeu seis meses extras de mandato, como um
bônus à administração que, na transparência dos balanços por amostragem, mais
que duplicou a dívida do Vasco, deixando o clube em frangalhos, devendo milhões
ao advogado flamenguista, ao goleiro Michel Alves e ao Sandro Silva, e
aumentando ainda mais essas dívidas, assinando confissões e mais confissões no
tempo de bonificação conquistado nos corredores dos tribunais.
Nisso a mídia
especializada assoviava para o alto, publicando tudo isso aí em cima como
coisas da vida, tudo absolutamente normal. Repórteres, editores, todo o rol de
especialistas na área futebolística não só deixaram em paz a gestão de Roberto
Dinamite como, muito pelo contrário, engoliram ávidos, sem uma perguntinha de
dúvida do lead tradicional, nem como, nem por que, nada, reverberaram a denúncia
mais mastigada impossível, risível, do que a imprensa, com a originalidade que
lhe é peculiar, chamou de mensalão vascaíno, denúncia essa espremida a fórceps
pelo grupo político do vice de finanças dos balanços por amostragem, o mesmo
que, como secretário de Fazenda, inaugurou a era de calotes aos servidores no
governo Benedita da Silva, antes de Cabral descobrir os cofres do estado, ainda
que esse dado, no mínimo curioso, não tenha sido lembrado pela mídia especializada
em nenhum momento dos seis anos nos quais o tal sujeito foi o responsável pela
situação financeira do Clube de Regatas Vasco da Gama.
Enquanto rebocos
caíam da marquise de São Januário como folhas no outono, enquanto as dívidas do
Vasco eram infladas, a mídia toda esportiva virou suas baterias, na campanha
das eleições adiadas até não poder mais pelo Judiciário, não à administração durante
a qual até uma criança da base do clube havia falecido em campo, no treino,
não, mas à oposição, com a denúncia de comédia pastelão, do tal mensalão que,
no fim das contas, injetou no clube, isso mesmo, rendeu à administração alçada
ao poder pela Justiça quantia superior a R$ 3 milhões em mensalidades atrasadas
e taxas de inscrição de novos associados, numa campanha amplamente divulgada no
site do movimento de oposição.
Como era de se
esperar, ainda, a denúncia condenando o aporte de R$ 3 milhões nos combalidos
cofres do clube não surtiu o efeito desejado, apesar da ampla divulgação na
mídia que àquela época, em relação ao Vasco, como indica a seriedade com a qual
tratou o assunto, já estava pra lá de aloprada. Nas eleições enfim realizadas,
seis meses após o fim do mandato da gestão que entregava o cargo, o velho
presidente destronado pela Justiça venceu com mais votos que os outros dois
candidatos juntos.
No primeiro ano do
novo mandato, o Vasco venceu o Carioca encerrando jejum de 12 anos no torneio e
caiu pela terceira vez à Série B, da maneira como aqui já foi relatada mais
amplamente. Em 2016 foi bicampeão, reassumindo a liderança isolada em títulos
invictos no estado e ampliando a invencibilidade que se tornou a maior da
história do clube, tudo em jogos oficiais. Enquanto isso os alojamentos da base
foram ressuscitados, reformados, o ginásio foi reconstruído, um time de
basquete, inativo durante toda a gestão anterior, foi sendo montado, um campo
anexo, para treinos, foi construído assim como o centro avançado de medicina
esportiva, tudo no mesmo complexo de São Januário no qual a intervenção mais
recente está sendo a reforma do parque aquático, de águas outrora esverdeadas.
Após o acesso tenso,
sofrido, na última rodada da Série B de 2016, no início do atual Campeonato
Brasileiro a mídia especializada previa para o Vasco uma luta ferrenha, quase
impossível contra novo rebaixamento, e repercutia em tom de chacota o que
chamava de bravatas do presidente do clube, que avisava que o time brigaria “nas
cabeças” e que a grande arma para isso seria São Januário.
Veio a estreia e as
chacotas aumentaram, sem que ninguém tivesse reparado que Jomar não tocou no
jogador do Palmeiras no primeiro pênalti marcado contra o Vasco, nos cinco
primeiros minutos do time no campeonato, nem dado a menor importância para o
puxão da camisa de Pikachu invadindo a área, ignorado pelo juiz quando o jogo
estava 1 a 0. O Vasco havia perdido de quatro, iniciava o campeonato na zona de
rebaixamento e era isso o que importava.
Mas então veio o
jogo contra o Bahia, vitória com festa, São Januário lotado e a mesma coisa
contra o Fluminense. O bom público se repetiu na derrota para o Corinthians e
passou da casa dos 10 mil nas vitórias sobre Sport e Avaí, para culminar no
estádio lotado, de crianças principalmente, na vitória sobre o Atlético Goianiense no horário das 11 da manhã. O time assumia ali a sexta colocação,
entrando na zona de classificação pra Libertadores, e lucrava a cada jogo em
seu estádio, financeira e esportivamente, até que veio o jogo contra o Flamengo.
O juiz não marcou
nada quando a bola, dentro da área, foi desviada pela mão descolada do braço de
Éverton Ribeiro. Depois, Luis Fabiano se precipitou e fez mesmo a falta quando
só precisava ter chegado perto e feito búúú pro meninote em tremedeira que, com
falta ou sem falta, daria o mesmo passe preciso pro Pikachu mandar pra rede. O
Éverton fez o gol da vitória rubro-negra e no fim do jogo um grupo específico
de “torcedores”, facilmente localizável na arquibancada, iniciou o bombardeio
ao gramado, sob os olhares à beira do complacente, quase embasbacados dos policiais
militares que, curiosamente, agiram de forma diferente do que sempre foi
recomendado nesses casos.
Não havia PMs nas
arquibancadas, nenhum policial fardado chegou perto dos baderneiros. Não houve
nada daquelas cenas clássicas nesses casos, do grupo de policiais chegando atrás
dos escudos, e com os cassetetes baixando o sarrafo pra debelar logo qualquer
briga, não. Em vez disso a Polícia adotou outra estratégia, ficando concentrada
no meio do gramado e lançando, ela também, bombas de efeito moral nos degraus
cheios de gente, deixando o grupo pequeno, facilmente identificável, à vontade
pra barbarizar na arquibancada, invadindo inclusive as cabines de tevê e rádio,
expondo um problema real de segurança em São Januário que, felizmente, após o
triste episódio foi sanado.
Barulho de bombas,
caos, cenas de guerra na casa do Vasco e um dos policiais chegou a exibir em
rede social vídeos dele mesmo lançando bombas na torcida vascaína, vangloriando-se
do feito ao lado de fotos suas com a camisa do Flamengo. E pode ser que tenha a
oportunidade de se divertir assim de novo, pois não foi repreendido por isso,
nem sequer questionado pelos superiores, nem pelo Ministério Público e nem
pelos jornalistas, que também não questionaram em nada a atuação da PM no caso.
Não aceitar a versão
das autoridades assim de imediato, questionar o máximo possível na busca da
verdade, evitar com todas as forças o chapa-branquismo, tudo isso se aprende no
primeiro ou no segundo período de uma faculdade de jornalismo, ou pelo menos se
aprendia, quando o diploma valia. Pois é exatamente o inverso disso que
acontece quando a mídia está aloprada e suas denúncias são, todas, mastigadas.
Não houve qualquer
questionamento, por exemplo, quando a PM chegou a informar que a vistoria de
bombas na entrada do estádio não era com ela. Tesourinha de unha, canivete,
garrafa de Pinho Sol, caixa-de-fósforo, tudo isso é com os policiais, mas
bomba... bomba, não, deu a entender a PM, e nada de dúvida, nem um “cuma?” de
Didi Mocó por parte da mídia que engoliu inteira, de um talo, a explicação de
um desses dossiês secretos, produzidos por sumas inteligências da área de segurança,
que chegou à seguinte conclusão para achar o culpado pelo ataque premeditado a
São Januário:
O presidente do
Vasco que havia apostado em São Januário como arma do time pra chegar à
Libertadores, que via o clube lucrar jogo a jogo no estádio lotado, este
presidente, então, segundo a imprensa, reproduzindo com fidelidade canina a
versão da PM, este presidente autorizou a entrada de bombas na sede do Vasco.
Para isso, contou com o auxílio de funcionários que aumentam seus salários com
as gratificações pagas por jogos em São Januário, mas mesmo assim, por alguma
razão que a mídia um dia talvez explique, ou não, mesmo assim esses
funcionários, quem sabe esfregando as mãos, dando risinhos de vilão ao lado do
presidente, resolveram rasgar dinheiro contribuindo para que o time perdesse o direito de todos
os outros times do campeonato, de mandar seus jogos pra sua torcida, em seu
estádio.
A disputa eleitoral
ferrenha, onipresente no noticiário do Vasco na dita grande mídia, a denúncia da
situação com exibição de mensagens numa rede social, de um suposto simpatizante
da oposição incitando a violência em São Januário, nada disso foi levado em
consideração no dossiê da PM, assim como foi esquecido um personagem surgido
com destaque de chamada no Jornal Nacional, com nome, sobrenome e profissão, um
óbvio provocador do tumulto que aparece sem camisa na arquibancada, chutando o
vidro inquebrável que separa o torcedor do gramado, em cima desse vidro,
jogando coisas no campo e agredindo até duas policiais militares, uma delas na cara.
Apesar de tamanha
afronta à corporação, a PM, nas suas acusações ao presidente do Vasco, parece
ter perdoado o agressor, pois se esqueceu completamente dele, talvez, quem
sabe, porque tal personagem não tenha se encaixado muito bem na narrativa
mastigadinha, engolida com vontade pela imprensa pra culpar o vilão de sempre,
e que serve agora pra que o Ministério Público, dez anos depois, volte a pedir
a destituição de uma diretoria do Vasco, no caso do mesmo presidente de 2007,
depois de não pedir nada parecido com isso no tempo da outra diretoria, nem com
provas cabais de desvio de verba, nem com a morte sem atendimento médico, num
treino, de um menino da base.
Não se sabe se o
mesmo promotor de dez anos atrás participa do novo pedido de interdição no
Vasco. Na matéria do Globo sobre o caso, por exemplo, publicada em página
inteira na sexta-feira, 15 de setembro, como principal notícia da editoria de
esportes, nessa matéria enorme não há um só nome de promotor. O Ministério Público
fala, diz, afirma e se preocupa em terceira pessoa, como se gente fosse, só que
o tal promotor já tinha aparecido quando do bombardeio de marginais e PMs a São
Januário, veio a público assinando, com os mesmos nome e sobrenome de 2007, a petição
do MP pedindo a interdição ad eternum de São Januário, muito além de qualquer
prazo estipulado por tribunais esportivos, querendo o fechamento sem volta do
estádio estampado na camisa atual do Vasco, justamente homenageado por ter completado, em 2017, 90
anos de história. Indo nessa toada, não é difícil acreditar que o promotor, preocupado
com o Vasco a depender da diretoria, um dia resolva (por que não?) pedir a demolição
de São Januário. Já que não pode ter jogo mesmo...
Quanto à nova
tentativa de intervenção do MP no Vasco, o motivo, agora, seria, segundo o
Globo, o vínculo do presidente do clube “com membros banidos por violência”. Os
membros, no caso, são de torcidas organizadas, que não entraram na legenda onde
o jornal afirma isso, muito provavelmente por exigências da diagramação. E na
página inteira na qual trata do assunto, o Globo não explica em uma linha
sequer que a decisão judicial suspendendo a torcida organizada Força Jovem, na
qual se baseia o MP pra pedir o que pediu, proíbe a torcida de se apresentar em
conjunto no estádio, uniformizada, com bandeira, faixa, surdo, tamborim etc. A
Justiça não proibiu ninguém que faça ou tenha feito parte da torcida de ir ao
estádio à paisana, nem de trabalhar como funcionário do clube.
Inexistem, portanto,
os tais “membros banidos por violência” citados pelo Globo, o que enfraquece as
“provas” apresentadas pelo MP para justificar seu segundo pedido contra o mesmo
clube, e só esse clube, provas essas menos comprometedoras do que esta imagem acima, do presidente do Flamengo a confraternizar com membros de torcidas organizadas tão violentas ou mais que
a do Vasco.
Intervenções do
Judiciário em todos os clubes do país, por isso deverá clamar o Ministério
Público fluminense daqui pra frente, se for coerente com as denúncias que ora
apresenta contra o Vasco, a pouco mais de um mês da eleição já marcada, para a
qual candidatos, da oposição principalmente, faziam boca de urna livremente,
sem serem importunados, quando das partidas deste ano com torcida em São
Januário.
Que os sócios do
Vasco, pagadores com sacrifício ou não de suas mensalidades, possam escolher
democraticamente o próximo presidente do clube, em eleição cuja data está
marcada sem que a atual diretoria mova um dedo, mindinho que seja, ao contrário
de sua antecessora, pra tentar prorrogar seu mandato no tapetão. Que a Justiça
não interfira de novo na soberania do nosso amado Vasco da Gama, que tantos prejuízos
sofreu, alguns deles irreparáveis, por causa da primeira intervenção judiciária,
malfadada e única, até hoje, entre os grandes clubes da bola.
Só no Vasco a
intervenção, só no Vasco o MP tenta, de novo, influenciar decisivamente o
processo eleitoral, e sem se importar se pra justificar isso a denúncia, diante
da morte de uma criança, da corrupção rotulada, carimbada e assinada, se diante
de tudo isso perdoado a denúncia da vez fica incompreensível de tão vaga. Não
importa se a banida é a torcida, não os torcedores, não interessa se não há
provas. O MP, na figura de certos promotores, continuará na sua toada, tão
convicto quanto em Curitiba, continuará enquanto tiver por trás o apoio da
mídia especializada sem questionar nenhum absurdo, nada, engolindo e gostando,
aloprada, as denúncias mastigadas.